
BREVE HISTÓRIA DO DIREITO PENAL - PARTE I
Estudar o Direito é estudar o homem e o corpo social a que ele pertence num determinado momento.
Sabe-se que o ser humano somente se realiza plenamente quando convive com seus semelhantes, porém, nem sempre esta convivência se mostra harmônica, pois, conforme leciona Ney Moura Telles “O homem não é absolutamente livre para fazer o que bem quiser” (TELLES, 2006, p. 1) e, dessa maneira, situações de conflito surgem frequentemente.
Inúmeras ocorrências não chegam a ser reguladas, vale dizer, resolvidas pelas normas do ordenamento jurídico, pois muitas vezes o controle social é eficazmente realizado mediante a atuação de outros órgãos e instituições, tais como a família, a escola, a Igreja etc. Mas, quando o comportamento desviante ofende bens fundamentais ao ser humano e à sociedade, se faz necessária a interferência do Direito com o fito de restabelecer, da melhor e mais eficaz maneira possível, a paz social.
Desse modo, percebe-se que o ordenamento jurídico, complexo de normas que têm por função regular a vida em sociedade, dispõe de variada gama de sanções a serem aplicadas àqueles que, com seu comportamento, acabam por ofender interesses e direitos de outrem, públicos ou privados.
Quando os bens mais relevantes ao ser humano e à sociedade são efetivamente atingidos ou ameaçados de ofensa, tais como a vida, a integridade física, a liberdade, o Estado oferece resposta cuja intensidade é diretamente proporcional à relevância dos valores maculados e, para tanto, utiliza-se de normas de natureza penal.
Assim, observa-se que a réplica mais rigorosa que o ordenamento jurídico apresenta pertine à transgressão de uma norma de natureza penal, cominando sanção que pode implicar em privação da liberdade do agente.
Sendo o homem violento por natureza, diz-se que o primeiro ramo do Direito concretamente concebido, antes mesmo de existir qualquer resquício de organização estatal, foi o Direito Penal, mais especificamente aquele alusivo à hoje denominada parte especial dos atuais códigos penais, pois, de plano, buscou-se estabelecer quais seriam as condutas consideradas proibidas, bem como suas respectivas sanções.
A história do Direito Penal está visceralmente ligada à história da pena. Como será visto a seguir, o mesmo Estado que buscou monopolizar a distribuição da Justiça, editando regras e normas comportamentais a serem regiamente obedecidas por seus destinatários, foi tirânico e desumano no que tange à intensidade da resposta oficial àqueles que se afastaram de seus comandos.
Segundo Silva Ferrão (1856, apud Dotti, 2004), o Direito Penal alusivo aos últimos quatorze séculos das nações modernas foi um exemplo de “oficialização” da barbárie.
A historia do Direito Penal é uma historia de crimes moraes, de tyrannias, de horrores, de tormentos, e de sangue, que fazem estremecer a humanidade, que hoje contempla os factos, e que não póde, na presença delles, deixar de recuar tremendo. Parece impossivel, que hovessem legisladores, juizes, executores da alta justiça, a representar activamentenas repetidas scenas de supplicios os mais variados,todos corporaes, todos afflictivos, a respeito dos quaes a imaginação do homem procurasse com esmero a preferência e a invenção de martyrios osmais dolorosos contra seres da mesma espécie, contra irmãos, contra filhos. Os homens, peóres queas feras, a pretexto de punir os malefícios,commeteram crimes mais reprehensiveis, que os que pretenderam reprimir. Deram o exemplo de crueldade, da violação dos direitos individuaes, e dos da propriedade (Theoria do Direito Penal, vol. 1, p. XXX/XXXI). (grafia original).
É fato incontroverso que o desenvolvimento do Direito Penal variou de povo para povo, região a região, tendo em vista o nível de desenvolvimento de cada uma das culturas onde aflorou e se estabeleceu.
Do mesmo modo, não há dúvida de que os contornos, postulados e princípios hoje prevalentes no Direito Penal de grande número de países foram cunhados lentamente, pois, nada obstante estejamos muito longe do aceitável relativamente ao tratamento concreto que se deve dispensar aos institutos penais, dentre eles, a pena, fato é que se almeja, ao menos no âmbito doutrinário e algumas vezesjudicial, atingiro máximo, a utopia, a efetiva concretização da legalidade e dos postulados da melhor doutrina garantista-penal.
O Direito Penal pode ser analisado em períodos históricos, os quais não guardam absoluta independência entre si, ou seja, as fases a seguir descritas não formam compartimentos estanques, findando uma e imediatamente tendo início a próxima. Antes, ao contrário. Permeiam-se, misturam-se, porém cada uma possui traços e características próprias, o que as faz possuírem certa identidade.
Referidas fases são comumente denominadas de vingança privada, vingança divina, vingança pública, período humanitário e período científico, este último,também denominado período criminológico.
Passemos, de forma abreviada, a verificar as características de cada uma delas em âmbito mundial e, paralelamente, sua manifestação em terras brasileiras. Verifiquemos, ainda, os traços mais característicos do Direito Penal romano, grego e canônico, em face de sua grande importância e influência.
Continuaremos, em breve, nossa incursão histórica a respeito do Direito Penal.
Autor: Francisco Ubirajara Camargo Fadel
Coordenador do curso de Direito.
Data de publicação: 22/11/2024
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